SETE OPORTUNIDADES EM LEITE FLUIDO POUCO EXPLORADAS PELAS INDÚSTRIAS BRASILEIRAS

25/08/2016
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Na economia e na política, estamos em uma época de alerta e mudanças. Além disso, o consumo de leite fluido está diminuindo ao longo das gerações. Longe de profetizar o caos, esse cenário é no mínimo desafiador para as indústrias de leite pasteurizado e UHT. Mas onde apostar e investir nos próximos anos? Se você pensou em iogurte grego mas quer sair do óbvio, confira esses segmentos que estão consolidados em outros países e que ainda não alavancaram no Brasil.

 

Antes, vamos explorar a realidade dos consumidores. Um estudo feito pelo USDA concluiu que o consumo de leite fluido vem diminuindo ao longo das gerações. Por exemplo, pessoas nascidas nos anos 70 bebiam mais leite quando comparadas às que nasceram nos anos 80. Atualmente, a geração nascida nessa década (2010) é a que menos consome leite fluido quando comparada às gerações nascidas nos anos 2000, 90, 80 e 70. A diminuição só não é mais acentuada pois o consumo de leite desnatado aumentou nesses 40 anos. Confira abaixo:

consumo de leite fluido 

 

O decréscimo acontece em todas as faixas etárias, em crianças, adolescentes e adultos de todas as idades. Vale lembrar que esses dados são do estudo americano. No Brasil, o consumo per capta de leite fluido é de 110 mL por dia, do qual 80% corresponde ao leite UHT. Os mercados mais expressivos estão no sul e sudeste, regiões responsáveis por 80% do consumo total.

 

O primeiro motivo para essa diminuição de consumo está relacionado à variedade dos produtos lácteos. Hoje temos diversos tipos de sobremesas e bebidas lácteas, além de iogurtes e outros produtos, como petit suisse, leites fermentados, em pó e etc. A variedade de produtos lácteos aumentou ao longo dos anos, alterando também nossos hábitos de consumo. Dessa forma, sobra menos espaço para o “leite puro”, como é chamado vulgarmente. Isso sem contar a competição com outras bebidas, como extratos de soja, sucos e outros. As gerações que eram acostumadas a beber leite vão saindo de cena e as novas gerações não incorporam totalmente seus hábitos alimentares. O resultado já conhecemos.

 

Talvez a maior diminuição esteja no consumo das crianças até 5 anos. Antigamente, o único leite disponível era o leite fluido. Hoje temos diversas fórmulas infantis que são receitadas pelos médicos como substitutos ao leite. Deixaremos a discussão entre os nutricionistas, pais e pediatras.

 

Não apenas a quantidade está diminuindo, mas também a frequência de ingestão. Antes, o consumo de leite acontecia mais vezes ao dia. Hoje, a tendência é relacionar o leite a um alimento matinal. Dessa forma, o consumo fica restrito apenas a um período do dia.

 

Outro motivo para esse cenário está relacionado aos movimentos sociais que desestimulam o consumo de leite. Entre eles está o público vegano, denominação para quem não consome (ou evita consumir) qualquer tipo de produto que tenha ingredientes de origem animal. Outros comportamentos sociais também ganharam força, todos contrários ao consumo de leite. Eles sempre existiram, mas com a popularização da internet e redes sociais, tomam proporções maiores nos dias de hoje. Com esse apelo popular, a maioria dos consumidores não consegue diferenciar uma informação científica de uma opinião pouco embasada. Por isso, canais que popularizam a verdadeira ciência são muito bem-vindos.

 

Fora do Brasil, surgem algumas estratégias para driblar a queda no consumo de leite fluido. Se fizermos uma busca detalhada, vamos encontrar tipos de leite bem curiosos. Por exemplo, uma indústria neozelandesa comercializa um tipo de leite voltado ao público da velha guarda, que não se acostumou à homogeneização, é o chamado “old school creamy”.

 

A indústria canadense comercializa leite destinado aos atletas, com alto teor de proteínas e poucos carboidratos. Também vamos encontrar as indústrias que usam o leite como veículo de outras substâncias, como probióticos, frutas, vitaminas e aminoácidos. A Itália tem máquinas de leite cru, semelhante às máquinas de refrigerante. O consumidor leva o seu recipiente, coloca algumas moedas e a máquina enche a garrafa.

 

Entre todos esses exemplos, vemos uma estratégia comum: a de segmentar o mercado para diversos perfis de consumidores. Esse é o conceito do individualismo e expressão pessoal. Outros conceitos também estão em alta para aumentar o consumo do leite fluido: regionalismo, sustentabilidade, rastreabilidade, promoção da saúde e bem-estar. Resumindo, a estratégia é priorizar o consumidor.

 

Algumas dessas opções podem ser desenvolvidas no Brasil, com investimentos técnicos relativamente baixos, mas com alto investimento em marketing. Confira 7 inovações que já são comercializadas em outros países:

 

Leite ESL: é a sigla em inglês para o “Leite de Vida Útil Estendida”. Não se trata apenas de postergar o prazo de validade do leite como o sistema UHT. O conceito ESL vai além, prometendo entregar um produto sem nenhum tipo de defeito de sabor. Ou seja, é um leite com sabor muito próximo ao leite recém ordenhado, sem interferência de micro-organismos, lipólises, rancificações, proteólises e etc. Essa tecnologia utiliza a microfiltração, membranas com poros capazes de reter micro-organismos e células somáticas. O leite pode ou não ser pasteurizado, dependendo da legislação do país. Na França esse mercado é muito expressivo. A vantagem também é industrial, uma vez que adiando o prazo de validade do leite pasteurizado, ganha-se na logística de expedição. O custo para a implantação de uma indústria com capacidade de processar 25 mil litros/h é de 600 mil euros. O custo para uma indústria UHT com a mesma capacidade fica acima de 1 milhão de euros. No Brasil podemos encontrar unidades de microfiltração a partir de 200 mil reais.

 

Leite saborizado: menta, baunilha, caramelo, banana, blueberry, café, laranja, manga e até o básico chocolate. São alguns dos sabores que o leite pode ser comercializado. Nos Estados Unidos é muito consumido pelas crianças, como substituto saudável aos refrigerantes e sucos de frutas com alto teor de açúcar. Embalagens chamativas, com personagens infantis e super-heróis são estratégias de venda. As estratégias atuais buscam atingir o público adulto, com sabores ainda mais criativos, como o leite saborizado com a exótica cerveja de sassafrás (root beer). Os principais consumidores são os asiáticos, responsáveis por quase 65% do consumo. Norte americanos consomem 15% e sul americanos 8,5% de um total de 20 bilhões de litros anuais. O brasileiro está aberto aos leites saborizados, é o que mostra uma pesquisa feita pela Royal DSM. Entre China, Brasil, Alemanha, EUA e Espanha, o Brasil é o país mais apto ao consumo: 37% dos adultos e 58% das crianças brasileiras tem intenções de consumir leites com sabor.

 

Leite gaseificado: se no Brasil associamos o leite à uma bebida de inverno, o leite gaseificado pode mudar esse hábito. É uma bebida leve, refrescante, que combina muito bem com nosso clima tropical. Esse produto é bastante comum na Ásia, e dependendo da marca pode ter maior ou menor quantidade de leite na mistura. O maior desafio das indústrias é introduzir o hábito de beber leite carbonatado. Na maioria das vezes, o consumidor compra apenas para satisfazer sua curiosidade. Na tecnologia, o desafio é evitar a coagulação do leite pela acidificação promovida pelo ácido carbônico. O processo também pode ser associado à saborização, é o que fez a norte americana E-moo, além das empresas tradicionais como a Coca-Cola e Schweppes.

 

Leite para dormir: ou goodnight milk é o leite com maior concentração de melatonina. É um processo natural, selecionando o leite de animais que foram ordenhados de noite ou madrugada. Nos animais, o ciclo de produção da melatonina varia junto com a luminosidade, que acaba sendo excretada pelo leite. A empresa irlandesa Lullaby já está comercializando o produto. A vida agitada, o estresse e outros problemas acabam resultando em distúrbios do sono, que afeta 40% dos brasileiros segundo a OMS. Ou seja, somos consumidores potenciais!

 

Leite A2: dependendo da genética, as vacas podem produzir leite com proteínas (beta-caseínas) A1 e/ou A2. A diferença entre elas é de apenas um aminoácido (histidina na A1 e prolina na A2). As consequências são inúmeras, mas vamos ressaltar as duas principais: diminuição do potencial alergênico e maior rendimento para derivados. A raça Gir leiteiro é uma das que produz o leite A2. Ainda há muita discussão na comunidade científica sobre o baixo potencial alergênico do leite A2. Enquanto isso, indústrias australianas e japonesas aumentam as vendas ofertando o leite A2 no mercado. A procura pelos consumidores é alta, mesmo com apenas 2,5% da população mundial alérgica às proteínas do leite. O trabalho de marketing é o responsável pela alta procura, associando o consumo do leite A2 com melhor digestão e prevenção de várias doenças.

 

Leites regionais: assim como o café, o leite também tem o seu terroir. Diferenças no clima, altitude, umidade, luminosidade, características do solo, água e alimentação influenciam no sabor do leite. Essa propriedade está sendo explorada por produtores suíços, que entre outras coisas, querem aumentar o lucro. A tendência de consumo também segue esse caminho. Vários estudos internacionais apontam que os consumidores estão dispostos a pagar preços diferenciados em alimentos regionais. E no Brasil? As diferenças territoriais são muito evidentes no sabor do leite. Os próprios consumidores percebem quando viajam. Leite do triângulo mineiro, leite da região de Castro-PR ou da região serrana de Santa Catarina seriam algumas das nossas opções. Eu fiquei com vontade de provar, e vocês?

 

Leite orgânico e BSTfree: leite orgânico é o leite proveniente de uma fazenda que pratica a agricultura e a pecuária orgânica. Para que possam comercializar seus produtos como "orgânicos", os produtores brasileiros devem ser certificados por um Organismo da Avaliação da Conformidade Orgânica (OAC) credenciado pelo MAPA; ou apenas cadastrarem-se no MAPA para realizar a venda direta sem certificação. Nos EUA a venda de leite orgânico aumentou quase 10% durante o ano de 2014. No mesmo período, a procura pelo leite convencional recuou quase 4%. O leite BSTfree segue a mesma linha. Por definição, é o leite proveniente de fazendas que não usam hormônio (somatotropina) para estimular a produção de leite. Alguns países já proibiram seu uso, mas no Brasil é permitido. Liberar, proibir? Esse é um tema que está em discussão e foi pauta durante a reunião entre os Comitês Coordenadores do Codex Alimentarius da América Latina, Caribe e da África no ano passado. O fato é que os consumidores têm aversão da palavra hormônio. Portanto, comercializar um produto com o rótulo “livre do hormônio BST” parece uma boa, não?

 

Concluindo, as opções para a indústria brasileira explorar são várias. Basta decidir qual a melhor estratégia. Mas atenção, a melhor estratégia nunca será boa o suficiente se não estiver associada a um ótimo trabalho de marketing. Como diria Steve Jobs: “As pessoas não sabem o que querem, até mostrarmos a ela”.

 

Data da Publicação: 25/08/2016.

Fonte: MilkPoint Indústria.

http://www.milkpoint.com.br/industria/radar-tecnico/leite-fluido/sete-oportunidades-em-leite-fluido-pouco-exploradas-pelas-industrias-brasileiras-101704n.aspx

 

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