ALTO NÍVEL DE CCS PREJUDICA LEITE E DERIVADOS

02/10/2015
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Contagem de células somáticas (CCS) tem sido usada como indicador da saúde do úbere e da qualidade do leite. As células somáticas são componentes naturais do leite e são compostas por células epiteliais (produtoras de leite) e por células responsáveis pela resposta imune (leucócitos), as quais incluem os macrófagos, neutrófilos e linfócitos. Nas vacas sadias, os leucócitos compõem aproximadamente 75% das células somáticas, enquanto as epiteliais representam os 25% restantes.

 

Entretanto, quando há infecção da glândula mamária, a população de leucócitos atinge entre 90% e 99% das células somáticas, com predomínio inicial dos neutrófilos. Desta forma, a contagem de células somáticas (CCS) tem sido usada principalmente como indicador da saúde do úbere e da qualidade do leite.

 

Biologicamente, a função das células somáticas é proteger a glândula mamária de infecções, por meio da imunidade inespecífica ou pela produção de anticorpos e resposta celular específica contra bactérias causadoras de mastite. Quando essas bactérias invadem a glândula mamária, por meio do canal do teto, há uma resposta imune para combater a infecção, sendo que um dos principais mecanismos da resposta é a migração de neutrófilos do sangue para o leite.

 

A função básica dos neutrófilos é eliminar as bactérias causadoras de mastite e produzir substâncias mediadoras da inflamação, os quais regulam a resposta imune. Por outro lado, os linfócitos atuam de forma a reconhecer a presença de antígenos e participar da resposta imune específica contra as bactérias, o que inclui a síntese de anticorpos.

 

Considera-se que o principal fator que altera a quantidade total de células somáticas do leite é a ocorrência de uma infecção intramamária. A gravidade e a intensidade da resposta imune são proporcionais ao aumento da CCS em resposta a uma infecção. Assim, em nível de rebanho, quanto maior o número de quartos infectados, maior a CCS do tanque. Em nível individual, considera-se que uma vaca leiteira apresenta mastite subclínica quando a CCS é maior do que 200 mil células por mililitro (ml).

 

No entanto, a legislação de cada país estabelece um limite máximo legal de CCS para o consumo humano: na União Europeia e no Canadá aceita-se CCS menor do que 400 mil células/ml; no Brasil, menos do que 500 mil cel/ml; nos EUA, menos do que 750 mil cel/ml.

 

Além da mastite, algumas características individuais da vaca também podem influenciar, ainda que de forma menos impactante, a CCS do leite: nível de produção, estágio e número de lactações, variação individual, fatores sazonais e ambientais. Por exemplo, os estudos indicam que a CCS aumenta de acordo com o avanço da lactação, o que pode ocorrer em razão do aumento da descamação e da morte de células epiteliais ao fim da lactação e pelo maior risco de novas infecções à medida que avança a lactação.

 

Da mesma forma, a idade e o número de lactações também podem influenciar a CCS. Além disso, a CCS de vacas primíparas é menor do que em vacas adultas, sendo que este aumento está associado ao aumento da prevalência da mastite subclínica em vacas mais velhas. No entanto, a CCS varia pouco entre vacas jovens e adultas, mas que estejam sadias.

 

Atualmente, a contagem de células somáticas pode ser realizada por vários métodos, mas o mais empregado tem sido a contagem eletrônica, por meio de metodologia de citometria de fluxo. Sendo assim, quando a CCS é realizada em amostras de tanque (rebanho) ou da vaca pode-se estimar as condições de saúde da glândula mamária e a qualidade do leite antes do processamento.

 

A mastite subclínica, e consequentemente o aumento da CCS, causa redução da produção de leite da vaca afetada, além de alterações da composição. Ambos os fatores estão diretamente relacionados ao nível de CCS, sendo que quanto mais alto ele for, maiores serão as alterações. Tais alterações estão diretamente associadas com a resposta imune durante a mastite, pois na inflamação há redução da capacidade de síntese de componentes do leite e aumento da permeabilidade dos capilares entre o sangue e o leite. A maior permeabilidade dos capilares sanguíneos no úbere inflamado resulta em maior passagem de substâncias entre sangue e leite, o que resulta na alteração da concentração de seus componentes.

 

As principais alterações encontradas no leite de vacas com mastite é a redução do teor de lactose, de caseína, de gordura e de cálcio do leite, em razão da menor capacidade de síntese pelas células epiteliais. Por outro lado, vacas com mastite produzem leite com maior teor de proteínas do soro, as quais são compostas principalmente por imunoglobulinas e enzimas. Do ponto de vista de processamento do leite, as alterações de composição causadas pela mastite resultam em redução do rendimento de fabricação de derivados lácteos como os queijos e o leite em pó.

 

Além do efeito negativo sobre o rendimento industrial, a mastite causa aumento da atividade enzimática do leite, pois tanto a presença de maior CCS quanto as alterações causadas pela inflamação aumentam significativamente a concentração de enzimas proteolíticas e lipolíticas. A consequência direta da maior atividade enzimática é a redução da vida de prateleira dos derivados lácteos e o aparecimento de defeitos de qualidade, entre os quais se destacam o sabor rançoso e amargo.

 

A liberação de ácidos graxos livres pela degradação da gordura do leite causa um defeito sensorial conhecido como “rancidez” do leite. No leite fresco de alta qualidade, a lipólise é causada principalmente pela ação da lipases presentes no leite, a qual está associada à fração de caseínas. No leite pasteurizado com alta CCS ocorre desenvolvimento de “rancidez” entre 14 e 21 dias após o processamento, enquanto o leite com baixa CCS não apresenta este defeito. Sendo assim, as células somáticas podem produzir lipases resistentes à pasteurização e que reduzem a vida de prateleira do leite pasteurizado.

 

O aumento da degradação da caseína do leite durante o armazenamento pode resultar em acúmulo de peptídeos, que podem estimular o aparecimento de sabor amargo e adstringente no leite. A degradação de caseína no leite cru com baixa carga microbiana ocorre principalmente pela ação de uma enzima, a plasmina. No leite com alta CCS, os leucócitos podem aumentar a degradação de caseína do leite.

 

Em razão da importância econômica, o impacto da alta CCS do leite sobre a qualidade e o rendimento do queijo foram bastante estudados. Diversas características de fabricação de queijo são afetadas pela mastite, dentre as quais podem ser destacadas o aumento do tempo de coagulação do leite, a diminuição da firmeza do coágulo do queijo, a maior perda de componentes do leite para o soro, o menor rendimento de fabricação e os defeitos de textura e alterações de características de sabor.

 

Num estudo brasileiro, leite de vacas com menos que 200 mil; 200 mil a 600 mil ou maior do que 600 mil células somáticas/mililitro foram utilizadas para a fabricação de queijo tipo minas frescal. De acordo com os resultados, o uso do leite com alta CCS resultou em prolongamento do tempo de coagulação do queijo. Além disso, o produto fabricado com leite de alta CCS apresentou menor acidez (resultando em alteração do sabor) e maior perda de gordura e proteína solúvel através do soro. A utilização do leite com alta CCS resultou em menor rendimento (9,81%) na fabricação de queijo, quando comparado com o leite com baixa CCS.

 

Na fabricação de iogurte, o uso de leite com alta CCS causa impacto negativo sobre o crescimento das culturas lácteas, o que pode afetar a processo de fabricação e afetar a qualidade final. Um estudo foi realizado para avaliar a composição e o sabor de iogurte integral fabricado com leite contendo diferentes níveis de CCS. Após armazenagem de 1, 10, 20 e 30 dias a 5 graus, as amostras de iogurte foram analisadas sensorialmente, sendo encontrada relação negativa significativa entre a CCS e a consistência e o sabor do iogurte avaliado aos 20 e 30 dias de armazenamento.

 

Nos estudos sobre o efeito da CCS do leite sobre a qualidade do leite ultrapasteurizado (UHT) foram encontradas apenas pequenas diferenças nas características sensoriais do leite UHT produzido com leite contendo alta CCS. No entanto, o leite UHT fabricado com leite de alta CCS apresentou tendência a coagular durante o armazenamento mais rapidamente do que o leite normal. Este defeito de qualidade do leite UHT pode ter ocorrido principalmente por causa da maior degradação da proteína do leite com alta CCS.

 

A mastite também afeta negativamente a qualidade do leite pasteurizado, pois acelera o desenvolvimento de defeitos de sabor, tais como “rancidez”e sabor amargo. Estes defeitos são causados pela lipólise e proteólise, respectivamente.

 

A alta CCS no leite cru causa redução da vida de prateleira do leite pasteurizado, pelo aparecimento de sabores indesejáveis. A redução da vida de prateleira é determinada pela ação de enzimas derivadas das células somáticas ou que passam do sangue para dentro do leite, mantendo a sua ação enzimática mesmo após a pasteurização.

 

Data da Publicação: 01/10/15

Fonte: Laticinio.net

http://www.laticinio.net/noticias/completa/17379_alto-nivel-de-ccs-prejudica-leite-e-derivados

 

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